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Artigo – A responsabilidade civil dos cartórios extrajudiciais por fraudes documentais

A evolução da responsabilidade civil dos cartórios por fraudes documentais, da objetiva à subjetiva, com análise legal, jurisprudencial e estratégias para maior segurança jurídica.

1. Introdução

Os cartórios extrajudiciais desempenham um papel central na estrutura do sistema jurídico brasileiro. Como delegados do poder público, os notários e registradores garantem a segurança, autenticidade e publicidade dos atos jurídicos. Contudo, sua responsabilidade civil tem sido objeto de intensos debates, especialmente no que se refere a fraudes documentais.

A evolução normativa e jurisprudencial delineou diferentes formas de responsabilização desses profissionais, oscilando entre a responsabilidade objetiva e subjetiva. Este artigo visa oferecer uma análise aprofundada sobre o tema, abordando a legislação vigente, os principais posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais, além de discutir boas práticas para prevenção de fraudes.

2. O papel dos cartórios extrajudiciais e a necessidade de responsabilização

O notariado brasileiro é regido pelo sistema do notário de fé pública, que impõe a esses profissionais a obrigação de garantir a veracidade dos atos praticados perante sua serventia. Os registradores, por sua vez, devem zelar pela legalidade dos documentos apresentados para registro.

Entretanto, fraudes documentais são uma realidade que desafia a credibilidade desses serviços. A responsabilidade civil dos cartórios surge como um mecanismo essencial para assegurar a proteção das partes envolvidas nos negócios jurídicos e garantir a confiabilidade do sistema.

3. Fundamentos legais da responsabilidade civil dos cartórios

A CF/88, no art. 236, § 1º, delega à legislação infraconstitucional a regulamentação das atividades dos cartórios, incluindo sua responsabilidade civil e criminal.

A regulamentação normativa está assentada nas seguintes leis:

Lei 6.015/73 (lei de registros públicos) – Art. 28: Os oficiais de registro são civilmente responsáveis pelos prejuízos causados aos interessados, desde que haja dolo ou culpa.

Lei 8.935/94 (lei dos cartórios) – Art. 22: Os notários e registradores respondem pelos danos que eles e seus prepostos causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso nos casos de dolo ou culpa dos prepostos.

Lei 13.286/16: Alterou a natureza da responsabilidade dos notários e registradores, exigindo comprovação de dolo ou culpa, afastando a presunção de responsabilidade objetiva que anteriormente recaía sobre esses profissionais.

Essa alteração legislativa provocou um intenso debate na doutrina. Se por um lado se entende que a subjetivação da responsabilidade protege os notários contra abusos, por outro, há o temor de que isso reduza a segurança jurídica e dificulte a reparação de danos para terceiros prejudicados.

4. Responsabilidade civil: Objetiva ou subjetiva?

Historicamente, a responsabilidade dos cartórios era interpretada como objetiva, ou seja, bastava a existência do dano e do nexo de causalidade para que houvesse obrigação de indenizar. Com a entrada em vigor da lei 13.286/16, a responsabilidade passou a ser subjetiva, exigindo a comprovação de culpa ou dolo.

A principal justificativa para essa mudança legislativa foi a impossibilidade de os notários e registradores controlarem todas as variáveis de um documento público, especialmente no caso de falsificações sofisticadas. Contudo, a responsabilidade subjetiva gera um ônus probatório maior para os prejudicados, que precisam demonstrar a negligência do cartório no caso concreto.

5. Análise da jurisprudência e evolução do entendimento judicial

A jurisprudência brasileira demonstra uma evolução significativa quanto à responsabilidade civil dos cartórios. Antes da lei 13.286/16, os tribunais aplicavam predominantemente a responsabilidade objetiva, conforme evidenciado em decisões anteriores a essa mudança legislativa

TJ/SC – AC 84131/07: Notário responsabilizado por negligência ao não verificar a autenticidade dos documentos apresentados para lavratura de escritura. O tribunal adotou o entendimento de que a fé pública do notário gerava a presunção de veracidade do ato, mas que, caso ocorresse um erro, a responsabilidade seria objetiva.

TJ/MG – AC 10647091032456003/13: Reconhecimento da responsabilidade solidária do tabelião, corretora e imobiliária em transação fraudulenta. A decisão reforçou o entendimento de que o tabelião deveria responder independentemente da verificação de culpa.

Com a entrada em vigor da lei 13.286/16, a jurisprudência passou a exigir a comprovação de culpa ou dolo para a responsabilização dos notários e registradores, conforme demonstram decisões mais recentes:

STJ – AgRg no AREsp 491976/RJ: Excludente de responsabilidade aplicada quando a falsidade documental não era perceptível a olho nu. O tribunal reforçou que a atuação do notário deve ser avaliada caso a caso, considerando se havia meios razoáveis para detectar a fraude.

TJ/DF – AC 682241620038070001/05: Exclusão da responsabilidade do tabelião por não ter participado da falsificação da procuração. O entendimento atual considera que o tabelião só pode ser responsabilizado se ficar comprovada sua omissão ou falta de diligência.

A tendência jurisprudencial mais recente aponta para um equilíbrio entre as abordagens, impondo a responsabilidade civil dos cartórios nos casos em que há falha na verificação de autenticidade dos documentos, mas afastando a condenação quando os mecanismos de conferência adotados foram adequados e o erro não era identificável.

6. Medidas preventivas e boas práticas

Diante da complexidade do tema, é fundamental que os cartórios adotem medidas rigorosas para mitigar riscos e reduzir fraudes. Algumas boas práticas incluem:

Verificação biométrica e certificação digital para garantir autenticidade dos atos notariais.

Aprimoramento dos mecanismos de controle documental, incluindo a exigência de mais certidões complementares em operações de risco elevado.

Uso de blockchain para criar um banco de dados inviolável sobre atos notariais, garantindo rastreabilidade e maior segurança.

Treinamento contínuo dos prepostos para identificação de fraudes sofisticadas e aprimoramento da segurança nos processos de verificação documental.

A implementação dessas medidas não apenas protege os cartórios contra eventuais ações judiciais, mas também reforça sua credibilidade e a segurança dos atos praticados.

7. Conclusão

A responsabilidade civil dos cartórios extrajudiciais por fraudes documentais é um tema que exige um olhar minucioso sobre a interação entre normas jurídicas, prática cartorária e novas tecnologias. A evolução legislativa tem buscado equilibrar a proteção dos usuários e a limitação dos riscos enfrentados pelos notários e registradores.

A jurisprudência tem consolidado um modelo híbrido de responsabilização, exigindo análise criteriosa dos casos concretos para definir se houve negligência ou se o cartório adotou as melhores práticas disponíveis.

O futuro da atividade notarial dependerá do contínuo aprimoramento de suas práticas e da modernização dos mecanismos de controle documental. Somente assim será possível garantir a segurança jurídica dos atos praticados e a proteção dos cidadãos contra fraudes, sem comprometer a eficiência do serviço notarial e registral no Brasil.

Fonte: Migalhas

Fonte: https://anoregpb.org.br/artigo-a-responsabilidade-civil-dos-cartorios-extrajudiciais-por-fraudes-documentais/


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